Quando nos apaixonamos por alguém, fixamos parte da nossa energia afetiva nessa pessoa. Quanto mais dessa energia afetiva depositamos, maior a sensação de paixão e amor temos por ela. É ao mesmo tempo um amor legítimo e falso, pois amamos a nós mesmos através do outro e buscamos satisfazer o desejo de carinho, sexualidade, companheirismo e, com isso, falamos “minha metade da laranja” “minha alma gêmea” ou “a tampa da panela”, numa identificação de inegável apego e posse. Enquanto não se alcança isso, sofremos com pensamentos incontroláveis e desenvolvemos a dor da perda por antecipação, a qual pode ser considerada um luto que se aproxima.
Na relação familiar, alguns filhos padecem ao pensar que irão perder para sempre o pai ou a mãe. Nesse relacionamento, quando há maus tratos, com excessos de críticas e agressões verbais por parte dos pais, a pessoa vai acumulando uma desilusão do amor paternal ou maternal, passa a sofrer com a raiva que acumula e ao mesmo tempo a censura que pratica, com remorso por não amar seus pais. Com isso, desenvolve melancolia em vista de um processo da perda do amor por eles, como num luto inexplicável, afetando sua vontade de viver. Tudo passa a ser agonia e até algumas tentativas de suicídio acontecem, com profunda tristeza e sentimento de culpa.
Embora isso seja vivenciado de forma diferente em cada pessoa, a perturba por toda a vida. Não somente a dor física, mas a fragilidade orgânica com doenças se manifesta junto com a dor psíquica, na qual um inferno mental transforma tudo em sofrimento e desastre. Todos vivemos uma espécie de distúrbio psíquico permanente, que mostra sua cara diariamente quando ficamos desanimados, tristes, angustiados, com sensação de desamparo e abandono e, o pior, é que nos sentimos responsáveis por tudo. Vivemos como uma democracia da tristeza que nos desloca do mundo, onde o desencanto toma proporções de epidemia.
Interesses econômicos da sociedade capitalista estimulam a consumir as pílulas douradas da vida como solução para a sua tortura, enriquecendo cada vez a grande indústria farmacêutica. Falsas promessas e muitos lucros. A tristeza, a dor e a angústia fazem parte da natureza humana e o fato de existirmos nos expõe a sensações diferentes em muitos momentos da vida. A dor tem sido condição para o desenvolvimento da natureza humana, determinando que sem dor não há crescimento: para nascer há dor, para morrer há dor.
O aprender também é com dor, pois aprendemos com as dificuldades e não na zona de conforto. Todo esse processo passa por angústia. Na vida adulta podemos estar realizados na vida afetiva e nas relações pessoais e profissionais, mas isso foi sedimentado pelo sofrimento na luta existencial. Viver é um processo constante de perder, ganhar e perder.
Se é difícil ganhar, é muito mais penoso perder. Como ensina a música popular, “vivendo e aprendendo a jogar, vivendo e aprendendo a jogar, nem sempre ganhando, nem sempre perdendo, mas, aprendendo a jogar”... (Aprendendo a jogar, Guilherme Arantes). https://www.letras.mus.br/guilherme-arantes/46301/
Crônica anterior / Página inicial / Crônica seguinte
Diversos 08/12